Já ouviu falar em inferno astral? Pois é, aconteceu comigo.
Era a semana do meu aniversário. Eu nunca fui de dar muita importância a esse dia não. Sabe, pra mim é matemática pura: se você nasceu numa data X e esse X se repete a cada ciclo de 12 meses, então a cada 12 meses o X se distancia um ano do marco zero. Logo, cada vez que a data do meu nascimento se repete isso que dizer que completei um ano (ou 12 meses) a mais. Tudo matemática! O tempo não respeita métricas, ele simplesmente passa sem parar. Pois bem, mais 12 meses estavam se completando naquela semana. Como todo ano, não me programei para organizar festinhas, rendez-vous ou qualquer coisa parecida, apenas vivi, comi e respirei. Faltando 2 dias e algumas horas para o “dia”, marquei com uma amiga de almoçarmos juntas no bandejão em frente à Praça das Rosas (e não, não há rosa alguma nela, apenas uma fonte quebrada que nos serve como banco). Assim que peguei o sorvete da sobremesa, esbarrei numa criança que brincava de correr ao redor da fonte quebrada e o resultado foi uma mancha napolitana no meu vestido. Minha amiga veio logo com um “Ah,menina! É por causa do seu aniversário que tá perto. É o seu inferno astral!”. Como é? Eu nunca reparei nesse inferno astral, nem sabia que existia, nem ao menos me lembro se havia catástrofes nas semanas que antecediam meu aniversário. O fato é que pude até não dar importância ao sorvete no vestido, mas aquele “inferno astral” não saía da minha cabeça. Despedi-me da minha amiga e segui para o Banco, onde trabalho. Fiquei tão distraída tentando encontrar alguma pista que confirmasse a TIA (Teoria do Inferno Astral) que quase acabei atropelada por um ônibus que buzinou por quase 30 segundos enquanto eu gritava me desculpando. Entrei correndo no Banco e fui direto para a minha sala, aflita com a descoberta do Inferno Astral. Assim que entrei, o telefone tocou: havia esquecido a reunião de preparativo para a festa junina da Associação. “Esse Inferno Astral tá pegando pesado”, pensei. Corri para a reunião, mas não sem antes me certificar pela segunda vez de que estava com a minha agenda em mãos, afinal estava sobre o julgo do I.A. Segurei-a tão forte para que não caísse e espalhasse os papéis que estavam amontoados em suas folhas que cortei o dedo no espiral de ferro… Espertinho esse Inferno Astral, mas ele não me pega, não! Enquanto limpava o sangue não tirei o olho da agenda, vai que o Inferno Astral resolve fazê-la desaparecer?! Fiquei tão focada na agenda que não vi quando chegou atrás de mim a nova estagiária levando cafezinho para os tarados do Setor de Vendas. Mais uma mancha negra para se juntar à mancha do sorvete do almoço. Quente e frio. Não aguentei: larguei tudo em cima da mesa e saí correndo para fora do prédio. “Se ficar parada aqui estou segura”. Havia tomado a decisão de não mais trabalhar ou me mover naquela tarde quando senti algo molhado no topo da minha cabeça. Fiquei imóvel. Não era possível que ele tivesse me seguindo até ali! Fiquei parada por uns segundos, tempo suficiente para que a gosma com cheiro de iogurte com manjericão escorresse até os meus lábios. O gosto não era nada mal, certamente algum molho especial pra salada, pensei. Mesmo besuntada de molho de dieta Ravena, permaneci sentada na escada até o último funcionário do banco sair. Afinal, não se pode brincar com essas coisas. Hoje sou outra pessoa depois da descoberta do Inferno Astral. Imagina se não soubesse nunca? Poderia até morrer! Viva a informação!
texto: Bruna Scavuzzi
Como sempre, muito criativa! Muito legal o texto, parabéns! Beijos, Daniel Magno
Gostei muito, Bruninha, vejo ai dois grandes talentos.
Beijoca para os dois.
Maria Quiteria.